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Resolução Nº 10.434/2025, DE 23 DE OUTUBRO DE 2025.

DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO ADMINISTRATIVO. TELETRABALHO EM CONDIÇÃO ESPECIAL. CUIDADOS A GENITORA IDOSA PORTADORA DE ENFERMIDADES GRAVES. INEXISTÊNCIA DE DEPENDÊNCIA LEGAL FORMALMENTE RECONHECIDA. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

PROCESSO DIGITAL Nº 4049-13.2025.6.27.8000 (SISTEMA ELETRÔNICO DE INFORMAÇÕES – SEI) – SÃO LUÍS

RECORRENTE: FLÁVIO MARCELO PEREIRA MARQUES

RELATOR: DES. PAULO SÉRGIO VELTEN PEREIRA

 

DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO ADMINISTRATIVO. TELETRABALHO EM CONDIÇÃO ESPECIAL. CUIDADOS A GENITORA IDOSA PORTADORA DE ENFERMIDADES GRAVES. INEXISTÊNCIA DE DEPENDÊNCIA LEGAL FORMALMENTE RECONHECIDA. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1. Trata-se de Recurso Administrativo contra decisão que indeferiu pedido de reconsideração relativo à concessão de teletrabalho em condição especial, formulado para prestar cuidados à sua mãe idosa, portadora de enfermidades crônicas e progressivas.

2. O Recorrente defendeu interpretação ampliativa do conceito de dependência legal, de modo a abranger a situação de cuidado filial, invocando princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da proteção à família e ao idoso, além de precedente judicial que admitiu flexibilização semelhante.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

3. A questão em discussão consiste em saber se é possível a concessão do regime de teletrabalho em condição especial a servidor para cuidar de sua genitora idosa e enferma, sem que ela se encontre cadastrada como sua dependente legal nos registros funcionais.

III. RAZÕES DE DECIDIR

4. A Resolução CNJ nº 343/2020 e a Resolução TRE-MA nº 9.816/2021 restringem a concessão de teletrabalho em condição especial a servidores com deficiência, necessidades especiais ou doença grave, ou àqueles que possuam filhos ou dependentes legais em idêntica situação.

5. O conceito de dependente legal não se presume do vínculo de parentesco, exigindo comprovação objetiva da dependência econômica, registrada nos assentamentos funcionais ou na declaração de imposto de renda, conforme disciplina a Lei nº 8.112/1990 e normas administrativas correlatas.
6. A Portaria TRE-MA nº 1445/2022, ao regulamentar o auxílio-saúde suplementar, dispõe que os genitores somente podem ser considerados dependentes se houver registro funcional para dedução do imposto de renda (art. 4º, VI), reforçando a exigência da formalização administrativa.
7. No caso concreto, a mãe do servidor não se encontra cadastrada como sua dependente legal, circunstância que inviabiliza a concessão do benefício.
8. Apesar da relevância dos princípios constitucionais invocados pelo recorrente, a Administração Pública encontra-se vinculada ao princípio da legalidade (CF, art. 37, caput), não sendo possível ampliar, por decisão administrativa, o alcance restritivo das normas vigentes.

IV. DISPOSITIVO E TESE

9. Recurso administrativo conhecido e não provido.

Tese de julgamento: “A concessão de teletrabalho em condição especial exige a comprovação da dependência legal, formalmente registrada nos assentamentos funcionais do servidor, não sendo possível ampliar o conceito para abranger situação de cuidado filial desvinculada da dependência econômica”.

Dispositivos relevantes citados

Constituição Federal, art. 37, caput

Lei nº 8.112/1990

Resolução CNJ nº 343/2020, art. 1º

Resolução TRE-MA nº 9.816/2021, art. 1º

Portaria TRE-MA nº 1445/2022, art. 4º, VI

 

 

               O TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO MARANHÃO, NO USO DE SUAS ATRIBUIÇÕES LEGAIS,

 

              RESOLVE CONHECER e, por maioria de votos, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ADMINISTRATIVO de Flávio Marcelo Pereira Marques, restando mantida a decisão que indeferiu pedido de reconsideração relativo à concessão de teletrabalho em condição especial, nos termos do voto do Juiz Relator. Vencidos os Juízes Ferdinando Serejo Sousa e Marcelo Elias Matos e Oka, que votaram pelo provimento do recurso.

 

               TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO MARANHÃO, em São Luís, 23 de outubro de 2025.

 

 

DesPAULO SÉRGIO VELTEN PEREIRA

 

RELATOR

 

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RELATÓRIO

Trata-se de Recurso Administrativo interposto pelo servidor Flávio Marcelo Pereira Marques, Técnico Judiciário, contra a Decisão nº 4896 / 2025 - TRE-MA/PRES/ASESP, que indeferiu pedido de reconsideração relativo à concessão de teletrabalho em condição especial, formulado com a finalidade de prestar cuidados à sua genitora, Sra. Vânia Maria Pereira de Carvalho, de 81 anos, portadora de enfermidades crônicas e progressivas.

O Recorrente sustentou a interpretação ampliativa do conceito de dependência legal, para abranger a situação de cuidado filial, invocando princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da proteção à família e ao idoso, bem como utiliza precedente judicial em que se admitiu flexibilização semelhante.

É o relatório.

 

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VOTO DO RELATOR

 

Presentes os requisitos intrínsecos de admissibilidade, concernentes ao cabimento (art. 228 do Regimento Interno), interesse e legitimidade recursais, bem como os extrínsecos relativos à tempestividade e regularidade formal, conheço do recurso interposto.

No mérito, a controvérsia cinge-se à possibilidade de concessão do teletrabalho em condição especial para que o servidor possa prestar assistência à sua mãe idosa, portadora de enfermidades graves e limitantes.

Embora a Junta Médica deste Tribunal tenha reconhecido a gravidade da situação clínica da genitora do servidor e recomendado o deferimento do benefício, deve prevalecer o disposto no art. 1º da Resolução CNJ nº 343/2020[1] e no art. 1º da Resolução TRE-MA nº 9.816/2021[2], que vinculam a concessão de condições especiais de trabalho a hipóteses específicas: servidores com deficiência, necessidades especiais ou doença grave, ou ainda aqueles que possuam filhos ou dependentes legais em idêntica condição.

Cumpre destacar que o conceito de dependente legal não decorre unicamente do vínculo familiar. Tanto na seara tributária (Regulamento do Imposto de Renda) quanto na administrativa (Lei nº 8.112/90 e regulamentos correlatos), exige-se a comprovação de dependência econômica, o que se faz mediante registro formal nos assentamentos funcionais ou declaração de imposto de renda.

De forma análoga, no âmbito administrativo deste Tribunal, a Portaria nº 1445/2022 TRE-MA/PR/DG/SGP/COPES/SEGEB, que regulamenta o auxílio-saúde suplementar, estabelece expressamente que os genitores apenas podem ser cadastrados como dependentes quando registrados nos assentamentos funcionais para fins de dedução do imposto de renda (art. 4º, VI). Ou seja, a condição de dependente legal exige não apenas o parentesco, mas a demonstração objetiva da dependência econômica, formalizada nos registros funcionais do servidor.

No caso concreto, conforme atestado pela SEGEB, a mãe do servidor não se encontra cadastrada como sua dependente legal, circunstância que inviabiliza o deferimento pretendido.

Por fim, em que pese o Recorrente tenha invocado princípios constitucionais e um julgado isolado, a Administração Pública encontra-se adstrita ao princípio da legalidade estrita e não pode ampliar, por decisão administrativa, o alcance das normas regulamentares vigentes. Portanto, a ausência de comprovação formal do requisito de dependência legal impede a concessão do regime de teletrabalho em condição especial.

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao Recurso Administrativo, nos termos da fundamentação supra.

É como voto.

 


[1]Art. 1º A instituição de condições especiais de trabalho dos magistrados(as) e servidores(as) com deficiência, necessidades especiais ou doença grave, bem como os que tenham filhos(as) ou dependentes legais na mesma condição, obedecerá ao disposto nesta Resolução, resguardada a autonomia dos tribunais, o interesse público e da Administração.

 

[2] Art. 1º Instituir condições especiais de trabalho para servidores com deficiência, necessidades especiais ou doença grave, bem como os que tenham filhos ou dependentes legais na mesma condição, no âmbito do TRE-MA.

 

                                     

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VOTO VOGAL DIVERGENTE

(Gabinete do Juiz Ferdinando Serejo Sousa)

Com o mais profundo respeito e a devida vênia ao eminente Relator, Desembargador Presidente Paulo Sérgio Velten Pereira, cujo zelo pela estrita observância das normas administrativas e seu profundo senso de responsabilidade com a gestão desta Corte são notórios e admiráveis, apresento divergência ao judicioso voto proferido.

O ponto central de minha discordância reside na interpretação conferida ao conceito de "dependentes legais", requisito presente no art. 1º da Resolução CNJ nº 343/2020 e replicado no art. 1º da Resolução TRE-MA nº 9.816/2021.

Em breve síntese, embora a posição do nobre Relator se ancore em uma interpretação literal e restritiva, vinculando a dependência à formalidade do registro para fins econômicos-fiscais, entendo que a matéria clama por uma análise teleológica e sistêmica, sob a égide de normas hierarquicamente superiores.

A Constituição Federal, em seu art. 229, estabelece de forma inequívoca que "os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade". Este dever, extraído do princípio fundamental da solidariedade familiar e intergeracional, transcende a esfera moral para se consolidar como uma obrigação jurídica plena.

A norma constitucional, ao impor o amparo, institui uma modalidade de dependência legal que não se restringe à dimensão patrimonial ou previdenciária, mas se afirma, primordialmente, na necessidade de cuidado, afeto e assistência. Trata-se de uma dependência existencial, juridicamente tutelada, que vincula o filho ao genitor idoso e enfermo, tornando-o, para todos os efeitos de proteção social emanados do Estado, seu dependente para fins de amparo.

Corroborando o mandamento constitucional, o art. 230 da Carta Magna atribui à família, à sociedade e ao Estado o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua dignidade e bem-estar. Este mandamento convoca o Estado, inclusive em sua faceta de empregador, a ser um agente facilitador do cumprimento desses deveres familiares, e não um óbice.

Por sua vez, a Lei nº 10.741/2003 (Estatuto da Pessoa Idosa) materializa essa diretriz ao consagrar a doutrina da proteção integral e da prioridade absoluta. Tais princípios não são meras abstrações; eles exigem do Poder Público uma atuação positiva e concreta, que inclui a adaptação de suas próprias normas administrativas para assegurar que os direitos da pessoa idosa sejam efetivamente realizados por aqueles que têm o dever primário de prestá-los: sua família. A prioridade absoluta significa, portanto, que na ponderação entre uma formalidade administrativa e a garantia de um direito fundamental à assistência familiar de um idoso em situação de vulnerabilidade, esta última deve prevalecer.

Ainda, é relevante notar que o dever de cuidado filial não é uma peculiaridade do ordenamento jurídico brasileiro, mas um princípio com vasta ressonância no direito internacional e comparado.

Instrumentos como os "Princípios das Nações Unidas para as Pessoas Idosas" (Resolução 46/91 da Assembleia Geral) reconhecem expressamente o "apoio familiar e comunitário" como pilar para a dignidade na velhice.

De forma ainda mais incisiva, convenções regionais, a exemplo do "Protocolo à Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos sobre os Direitos das Pessoas Idosas", obrigam os Estados-partes a adotar políticas que incentivem e fortaleçam a capacidade das famílias de cuidar de seus membros idosos.

Em jurisdições de direito civil, como a França (com a obligation alimentaire) e a Alemanha (Unterhaltspflicht), o dever de sustento e assistência entre parentes em linha direta é um princípio basilar do direito de família, codificado para assegurar a solidariedade intergeracional.

Essa perspectiva global demonstra que a proteção e o amparo aos pais idosos constituem um valor jurídico universal, devendo orientar a interpretação das normas internas de modo a maximizar sua eficácia.

Essa linha interpretativa, que privilegia a finalidade da norma e a proteção à família, encontra eco na jurisprudência pátria, que tem consistentemente flexibilizado a exigência de dependência meramente econômica em situações análogas. Notadamente, em casos de remoção de servidor por motivo de saúde de familiar (art. 36 da Lei nº 8.112/90), o Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento de que "a dependência familiar não pode se restringir somente a aspectos econômicos, devendo levar em consideração outros fatores, tais como a gravidade da doença, a necessidade de acompanhamento, bem como o sofrimento psicoemocional que envolve tanto o Servidor quanto seu dependente" (AgInt no AREsp 1118941/MA, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, J.: 21.02.19). Essa mesma lógica tem sido aplicada diretamente a pedidos de teletrabalho, como exemplifica julgado do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (AI 1029965-98.2024.4.01.0000), o que demonstra ser uma tese jurídica consolidada e perfeitamente aplicável ao caso em tela.

Sobre o entendimento do STJ, ilustra-se:

ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REMOÇÃO DE SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. ART . 36, III DA LEI 8.112/1990. GENITOR EM ESTADO GRAVE DE SAÚDE. A DEPENDÊNCIA FAMILIAR NÃO PODE SE RESTRINGIR TÃO SOMENTE A FATORES ECONÔMICOS . GARANTIA CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO À SAÚDE E À FAMÍLIA. REQUISITOS AUTORIZADORES DA REMOÇÃO POR MOTIVO DE SAÚDE DO SERVIDOR OU DE SEUS DEPENDENTES RECONHECIDOS PELA CORTE DE ORIGEM. AGRAVO INTERNO DO ESTADO DO MARANHÃO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1 . O fato de não constar no assentamento funcional da Servidora seu genitor como dependente econômico não pode ser um fator impeditivo para sua remoção, uma vez que a dependência familiar não pode se restringir somente a aspectos econômicos, devendo levar em consideração outros fatores, tais como a gravidade da doença, a necessidade de acompanhamento, bem como o sofrimento psicoemocional que envolve tanto o Servidor quanto seu dependente. 2. Agravo Interno do ESTADO DO MARANHÃO a que se nega provimento.

(STJ - AgInt no AREsp: 1118941 MA 2017/0140788-0, Relator.: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 21/02/2019, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/02/2019)

Nesse contexto, a expressão "dependentes legais" contida nas resoluções administrativas não pode ser interpretada de forma a esvaziar o comando constitucional. A dependência para fins de cuidado e amparo, nascida diretamente da Constituição e do Estatuto da Pessoa Idosa, é uma espécie de dependência legal que não se confunde e não pode ser condicionada à dependência econômica para fins tributários.

Renovando todas as vênias, permitir que uma formalidade administrativa (o registro nos assentamentos funcionais) se sobreponha a um dever constitucional seria incorrer em uma antinomia de valores que o ordenamento jurídico não chancela, subvertendo a hierarquia das normas.

No caso concreto, a necessidade de amparo foi cabalmente demonstrada e atestada pela Junta Médica Oficial deste Tribunal, que, em parecer conclusivo (ID 2470329), não apenas reconheceu a severidade do quadro clínico da genitora do servidor, mas também fatos que reforçam a imprescindibilidade de sua assistência, ao constatar que o interessado é filho único e reside com sua mãe. Tais circunstâncias, aliadas à natureza crônica e progressiva das enfermidades, levaram a Junta a recomendar a condição especial de trabalho sem necessidade de reavaliação. Ignorar tal parecer técnico, fundamentado e detalhado, seria desconsiderar a própria finalidade da norma, que é viabilizar que o servidor cumpra seu dever legal e constitucional de amparo sem prejuízo de suas atividades laborais.

Ademais, é imperativo considerar a questão sob a ótica da preservação do interesse público e da eficiência administrativa. A concessão da condição especial de trabalho não representa uma licença ou afastamento das atividades laborais; ao contrário, assegura a continuidade da prestação do serviço pelo servidor, que poderá conciliar suas obrigações funcionais com o dever constitucional de amparo familiar. Some-se a isso o fato de que o servidor, conforme se extrai dos autos, já laborou em regime telepresencial, demonstrando total capacidade de manter e até mesmo otimizar sua produtividade fora das dependências físicas do Tribunal, o que mitiga qualquer receio quanto a um eventual decréscimo no desempenho de suas funções.

Negar o pleito, por outro lado, expõe a Administração a um risco concreto de prejuízo: a iminente possibilidade de o servidor, diante da necessidade inadiável de assistir sua genitora, ser compelido a solicitar sucessivas licenças para tratamento de saúde de pessoa da família, direito que lhe é assegurado pelo art. 81, inciso I, da Lei nº 8.112/90. Tal cenário resultaria em descontinuidade do serviço, com ônus muito superior ao da simples adaptação do regime de trabalho, demonstrando que a medida pleiteada é também a que melhor atende ao princípio da eficiência.

Além disso, conforme parecer emitido pela área técnica desta Corte (INFORMAÇÃO Nº 4686 - TRE-MA/PRES/DG/SGP/COTEJ/SEINF), o entendimento de que “a dependência familiar não pode se restringir somente a aspectos econômicos, devendo levar em consideração outros fatores, tais como a gravidade da doença, a necessidade de acompanhamento, bem como o sofrimento psicoemocional que envolve tanto o servidor quanto seu dependente” segue “a mesma linha interpretativa adotada para as situações de remoção por motivo de saúde quando envolvem familiares do servidor que não vivem sob sua dependência econômica e não estão registrados em seus assentamentos funcionais”.

Cumpre ressaltar, por fim, que o deferimento do pleito observa rigorosamente outros preceitos das normas de regência. Vejamos.

A Resolução TRE-MA nº 9.816/2021, em seu art. 3º, § 3º, é expressa ao determinar que "a condição especial de trabalho não implicará despesas para o TRE-MA", o que é plenamente atendido na modalidade de teletrabalho. Da mesma forma, o servidor em regime especial não se exime de suas obrigações funcionais, devendo participar das substituições automáticas e das escalas de plantão, na medida do possível, conforme o art. 9º da mesma resolução, o que garante a continuidade e a regularidade do serviço público.

Ante o exposto, renovando o mais elevado respeito ao eminente Relator, divirjo de seu voto para DAR PROVIMENTO ao Recurso Administrativo, a fim de conceder ao servidor FLÁVIO MARCELO PEREIRA MARQUES a condição especial de trabalho, na modalidade de teletrabalho, nos termos do parecer favorável da Junta Médica Oficial.

É como voto.

 


Ementa. DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO. TELETRABALHO ESPECIAL. CUIDADO DE GENITORA IDOSA E ENFERMA. CONCEITO DE DEPENDÊNCIA LEGAL. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. DEVER CONSTITUCIONAL DE CUIDADO E AMPARO FAMILIAR. ART. 229 DA CF/88. ESTATUTO DA PESSOA IDOSA. PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE FAMILIAR. LAUDO FAVORÁVEL DA JUNTA MÉDICA OFICIAL. PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1. Recurso Administrativo interposto por servidor contra decisão que indeferiu pedido de reconsideração para a concessão de condição especial de trabalho, na modalidade teletrabalho, para prestar assistência à sua genitora idosa e enferma.

2. A decisão de indeferimento fundamentou-se em uma interpretação restritiva do conceito de "dependentes legais", conforme o art. 1º da Resolução CNJ nº 343/2020 e o art. 1º da Resolução TRE-MA nº 9.816/2021, vinculando-o à necessidade de registro formal para fins econômico-fiscais.

3. O recorrente sustenta, em suma, que a dependência para fins de cuidado e amparo decorre de um dever constitucional e deve ser considerada para a concessão do benefício, especialmente diante da recomendação da Junta Médica Oficial.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

4. A principal questão em discussão desdobra-se em: (i) saber se o conceito de "dependentes legais" para fins de concessão de teletrabalho especial a servidor público, previsto na Resolução CNJ nº 343/2020 e na Resolução TRE-MA nº 9.816/2021, restringe-se à dependência econômico-fiscal formalmente registrada; ou (ii) se abrange o dever de amparo e cuidado de genitora idosa e enferma, decorrente do art. 229 da Constituição Federal e do Estatuto da Pessoa Idosa, configurando uma modalidade de dependência legal de natureza existencial.

III. RAZÕES DE DECIDIR

5. A Constituição Federal, em seu art. 229, estabelece o dever dos filhos maiores de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. Essa obrigação, fundada no princípio da solidariedade familiar, institui uma modalidade de dependência legal de natureza existencial e assistencial, que transcende a dimensão puramente patrimonial.

6. A expressão "dependentes legais" contida nas resoluções administrativas deve ser interpretada de forma teleológica e sistemática, em conformidade com as normas constitucionais (arts. 229 e 230 da CF) e com os princípios da proteção integral e da prioridade absoluta previstos na Lei nº 10.741/2003 (Estatuto da Pessoa Idosa), de modo a não esvaziar o comando de amparo familiar.

7. A formalidade administrativa, como o registro da dependência para fins fiscais, não pode se sobrepor a um dever constitucional, sob pena de subversão da hierarquia das normas e de violação a valores fundamentais do ordenamento jurídico.

8. O parecer conclusivo da Junta Médica Oficial do Tribunal, que atestou a severidade do quadro clínico da genitora e a imprescindibilidade do acompanhamento pelo servidor, constitui elemento técnico fundamental que corrobora a necessidade da medida.

9. A concessão da condição especial de trabalho atende ao princípio da eficiência administrativa, pois assegura a continuidade da prestação do serviço, evitando o risco de sucessivas licenças para tratamento de saúde de pessoa da família (art. 81, I, da Lei nº 8.112/90), o que geraria maior prejuízo e descontinuidade ao serviço público.

IV. DISPOSITIVO E TESE

10. Provimento do Recurso Administrativo para conceder ao servidor a condição especial de trabalho, na modalidade de teletrabalho.

Tese de julgamento: O conceito de "dependentes legais", previsto em normas que regulamentam o teletrabalho especial para servidores públicos, deve ser interpretado de forma teleológica e em conformidade com a Constituição Federal, abrangendo não apenas a dependência econômico-fiscal, mas também o dever constitucional de cuidado e amparo dos filhos maiores aos pais idosos e enfermos (art. 229 da CF/88), mormente quando a necessidade de assistência é atestada por junta médica oficial.

Dispositivos relevantes citados:

Constituição Federal: art. 229 e art. 230.

Lei nº 8.112/1990: art. 81, I.

Lei nº 10.741/2003.

Resolução CNJ nº 343/2020: art. 1º.

Resolução TRE-MA nº 9.816/2021: art. 1º, art. 3º, § 3º, e art. 9º.

 

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VOTO VOGAL 

(Gabinete do Juiz Rodrigo Maia Rocha)

 

 

Adoto como relatório a parte expositiva do bem lançado voto do MM. Relator, Des. Paulo Velten.

E apenas para rememorar as premissas fáticas do julgado, ressalto, conforme bem delineado tanto pelo MM. Relator quanto pelo MM. Juiz Ferdinando Serejo, que abriu a divergência, que o presente Recurso Administrativo tem como núcleo a apreciação do pedido de reconsideração relativo à concessão de teletrabalho em condição especial, formulado com a finalidade de prestar cuidados à sua genitora, portadora de enfermidades crônicas e progressivas.

O MM. Relator, em percuciente manifestação que cristaliza seu esmero ante as normas administrativas, concluiu pelo indeferimento do pedido, na medida em que a genitora não se encontra registrada nos assentamentos funcionais do recorrente como dependente, visto que a condição de dependente legal exige não apenas o parentesco, mas a demonstração objetiva da dependência econômica, formalizada nos registros funcionais do servidor, circunstância que não se observa no caso concreto.

Por sua vez, o MM. Juiz Ferdinando Serejo, em suas sempre criteriosas e elogiáveis manifestações, inaugurou a divergência em relação a interpretação conferida ao conceito de "dependentes legais", requisito presente no art. 1º da Resolução CNJ nº 343/2020 e replicado no art. 1º da Resolução TRE-MA nº 9.816/2021, concluindo, com base em preceitos constitucionais e princípios administrativos, além de parecer da Junta Médica Oficial deste eg. Regional, pela concessão ao servidor a condição especial de trabalho, na modalidade de teletrabalho.

Tendo em vista o debate firmado durante a sessão administrativa e a sensibilidade do tema, pedi vistas dos autos a fim de analisar a possibilidade de adequar a quadra dos autos a precedentes vinculantes a respeito da matéria.

Pois bem.

Consta dos autos parecer da Junta Médica deste Tribunal reconhecendo a gravidade da situação clínica da genitora do servidor e recomendado o deferimento do benefício.

Por outro lado, consta da Resolução CNJ nº 343/2020 e da Resolução TRE-MA nº 9.816/2021, normativos que vinculam a concessão de condições especiais de trabalho a hipóteses específicas: servidores com deficiência, necessidades especiais ou doença grave, ou ainda aqueles que possuam filhos ou dependentes legais em idêntica condição, vejamos:

Art. 1º A instituição de condições especiais de trabalho dos magistrados(as) e servidores(as) com deficiência, necessidades especiais ou doença grave, bem como os que tenham filhos(as) ou dependentes legais na mesma condição, obedecerá ao disposto nesta Resolução, resguardada a autonomia dos tribunais, o interesse público e da Administração.

[...]

Art. 1º Instituir condições especiais de trabalho para servidores com deficiência, necessidades especiais ou doença grave, bem como os que tenham filhos ou dependentes legais na mesma condição, no âmbito do TRE-MA.

Logo, conforme as conclusões do MM. Relator, a condição de dependente legal exige não apenas o parentesco, mas a demonstração objetiva da dependência econômica, formalizada nos registros funcionais do servidor.

Todavia, compulsando o assentamento funcional do recorrente, constata-se que a mãe do servidor não se encontra cadastrada como sua dependente legal, circunstância que, em princípio, inviabiliza o deferimento pretendido.

Em conclusão, o MM. Relator consignou que, embora do recorrente tenha invocado princípios constitucionais e um julgado isolado, a Administração Pública encontra-se adstrita ao princípio da legalidade estrita e não pode ampliar, por decisão administrativa, o alcance das normas regulamentares vigentes.

Assim, em uma análise que prima pela observância da estrita legalidade e das normas que regulamentam a matéria, pouco espaço há para conclusões diversas.

Em contrapartida, certo é que no vértice de nosso ordenamento jurídico, encontra-se nossa Constituição Federal, que estabelece, como bem pontuou o MM. Juiz Ferdinando Serejo em seu voto divergente, em seu art. 229 que "os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade", dever, extraído do princípio fundamental da solidariedade familiar e intergeracional, transcende a esfera moral para se consolidar como uma obrigação jurídica plena.

Além disso, em seu art. 230, atribui à família, à sociedade e ao Estado o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua dignidade e bem-estar.

Nesse trilhar, há inúmeros mandamentos legais, à exemplo da Lei nº 10.741/2003 (Estatuto da Pessoa Idosa), da (Resolução 46/91 da Assembleia Geral (Princípios das Nações Unidas para as Pessoas Idosas), que subsidiariam a ampliação do conceito de dependência legal.

Da mesma forma, há alguns precedentes jurisprudenciais que justificam a concessão do pedido. (STJ - AgInt no AREsp: 1118941 MA 2017/0140788-0, Relator.: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 21/02/2019, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/02/2019)

Todavia, como bem pontuado nos debates, estivéssemos em uma sessão jurisdicional e não administrativa, viável seria a aplicação dos princípios elencados, bem como a adequação normativa necessária ao caso concreto.

Certo é que a ampliação do conceito de dependência legal tem sido aplicada em casos pontuais através de decisões judiciais e não administrativas.

As recentes flexibilizações e adaptações, especialmente motivadas pela pandemia de COVID-19, destacam uma prioridade para grupos que demandam mais atenção, como pais de crianças pequenas e pessoas com deficiência. Ainda assim, cuidam-se de pleitos para que a dependência afetiva seja reconhecida em certas situações.

Há projetos de lei que buscam garantir preferência para o teletrabalho a empregados que sejam responsáveis por pessoas com deficiência, sem limite de idade para o dependente. Trata-se da inclusão de dependentes emocionais ou afetivos, mas, ressalto, ainda no plano dos projetos e requerimentos. Nesse sentido, os PLs 340/2025 e 503/2023, em trâmite na Câmara dos Deputados e que buscam conceder prioridade no teletrabalho a empregados responsáveis por pessoas com deficiência e o PLs 331/2025, em trâmite no Senado Federal.

Em extensa análise da matéria, não encontrei precedentes, além daqueles já citados, com força vinculante.

No ponto, durante os debates da sessão administrativa, fiz alusão ao MS 25.888 (AgR/DF), julgado pelo STF, em que a Suprema Corte, por maioria, fixou balizas em que o TCU não pode exercer controle abstrato de constitucionalidade; o uso da Súmula 347 não autoriza afastar, genericamente, leis sem inconstitucionalidade manifesta nem jurisprudência pacífica do STF. Na prática, os Tribunais de Conta, na seara administrativapodem afastar norma no caso concreto para preservar a Constituiçãopreferencialmente quando haja jurisprudência do STF; não podem declarar, com efeito geral, a inconstitucionalidade.

E tal entendimento se aplica à hipótese em julgamento visto que este Regional julga em sede administrativa também e, diante do precedente firmado, não pode declarar a inconstitucionalidade de norma ou parte dela, sem redução de texto, na ausência de jurisprudência consolidada do STF ou substituir um regime por outro com fundamento abstrato

No caso concreto, a despeito do bem fundamentado voto divergente, penso que a norma que rege a matéria, Resolução CNJ nº 343/2020, foi expressa ao prever que a concessão de condições especiais de trabalho a magistrados, magistradas, servidores e servidoras está relacionada aos seus filhos ou dependentes legais que possuam deficiência, necessidades especiais ou doença grave.

Com efeito, os atos da Administração Pública são regidos pelo princípio da legalidade estrita, ou seja, sua atuação deve se limitar aos ditames da lei, conforme previsto no caput do artigo 37, da Constituição da República, em especial, os regimes jurídicos aos quais estão submetidos os magistrados e servidores.

Além disso, o poder regulamentar confere à Administração Pública a prerrogativa de editar atos gerais para complementar as leis, sem, no entanto, extrapolar o conteúdo nelas contido.

Nessa senda, em que pese possa haver jurisprudência esparsa em sentido contrário, deve ser recordado que, ao exercer a atividade regulamentar, os órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública somente estão obrigados a acatar os precedentes de caráter vinculante (decisões em controle concentrado e súmulas vinculantes - artigos art. 102, § 2º e art. 103-A, ambos da Constituição Federal).

Assim, não cabe aos Tribunais, por meio de atos infralegais, alargar o conceito de dependência previsto nas leis que disponham sobre a matéria.

Com base nessas razões, VOTO, acompanhando o relator, para negar provimento ao Recurso Administrativo.

É como voto.

Este ato não substitui o publicado no DJE-MA nº 193 de 30.10.2025, p. 95-103.

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